quinta-feira, janeiro 12, 2012

Carla Cabral


Nasceu no Funchal em 1971. Licenciatura em Pintura pelo Instituto Superior de Artes Plásticas da Madeira.

Participa desde 1990 em diversas exposições colectivas e individuais em diversas cidades do país e no estrangeiro.
Destaca-se ainda no seu percurso, ilustrações (revistas, CD, livros,), cartazes, trabalhos no âmbito da escultura e pintura de murais públicos.

Bio-grafiapresa é uma exposição que envolve trabalhos no âmbito das artes plásticas e que aborda um conjunto de temáticas e técnicas diversas, tais como desenho, pintura a acrílico, pintura a óleo, colagens, instalação. Estas técnicas são agora abordadas pela artista, em forma de autobiografia, salientando os anos em que explorou cada técnica e temáticas, que quase sempre envolvem o “Eu”, sempre muito distinto no seu trabalho.


A exposição abrange ainda um conjunto de textos seleccionados pela Pintora e pelo Escultor Paulo Sérgio BEJu, que cooperou nesta mostra da Artista. Estes textos servem de complemento ao trabalho visual, (expostos junto das obras), incluindo nomes de escritores madeirenses e nacionais tais como, António José Gonçalves (inédito 2005), Teresa Klut, Inês Lourenço, Jorge Sousa Braga entre outros.

O Artista Paulo Sérgio BEJu, escreve para o catálogo/panfleto da exposição Bio-Grafiapresa 2011,envolvendo outros dois textos, de valter hugo mãe, in catálogo de exposição Correspondência Fora de Formato – Carla Cabral, CCCâmara de Lobos, Edição CMCL, jun2009, e de Rita Rodrigues, in catálogo de exposição Eu Carla Cabral, Galeria da SRTC.

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Texto de Paulo Sérgio BEJu- Bio-Grafiapresa 2011.


TRATADO de um corpo dramático como objecto de registo.

Um corpo não é uma entidade abstracta, um receptáculo onde se podem colocar atributos tais como alto, baixo, forte, magro; não é uma esfera a que se circunscreve o ser num determinado tempo, mas é uma energia, onde se inscrevem circulações, substâncias, forças, pigmentações, comportamentos resultantes de treinos, de técnicas e de linguagens a que está permanentemente sujeito. RIBEIRO, António Pinto, Por exemplo a cadeira – ensaio sobre as artes do corpo, Lisboa, Edições Cotovia, 1997, p.7

Há portanto, corpos nos quais é possível detectar diferenças de funcionamento e de comportamento, às vezes radicais (RIBEIRO, António Pinto, 1997).
O corpo, nas representações plásticas de Carla Cabral, tem vindo a adoptar um programa dramático, seguro, muito sEU. Familiarizamo-nos com uma construção da angústia, das palavras inexistentes, das vestes, casas, tecidos ou objectos como fardo ou fado obscuro. Outrora as figuras clássicas tomavam o lugar nas telas da sua criação. Eram referências da história da arte ou de determinados artistas, poses e presentificações a iniciarem as encenações de uma artista em ebulição interna. A técnica, presa numa reapropriação da arte que não se gasta no tempo, re-inventa-se.
Os corpos foram-se autonomizando pelas mãos da artista, hoje, as PESSOAs reproduzidas sobre os suportes de papel ou tela, surgem numa linguagem de austeridade depurativa. Cunho de uma emotividade estranha, resguardada de forma perturbadora e atrativa. O OLHAR latente do fruidor, desenha-se sobre figuras esquálidas, esguias, crianças crescidas, expostas à ausência do amor de deus.
A enfermidade depurada que as telas mais recentes de Carla Cabral ensaiam, é uma dor do mundo, vomitada por uma crise de tudo o que nos incomoda enquanto crentes. Sustemos a respiração do pincel, a técnica é menos pictórica, mais agressiva (talvez) e ao mesmo tempo ambígua, porque também é depurada no traço, na mancha, na limpeza ou presença sumária de coisas afetivas.
Com os corpos crescem os poemas da alma.
A exposição bioGRAFIA.PRESA expressa uma possibilidade dilacerada que não se VÊ, preSSENTE-SE. Este tempo é um poema, o da Carla Cabral, no aprisionamento dum processo de aperfeiçoamento profundo. A sua arte ficciona um reinado anémico, espelhado em rostos de figuras descoroadas. O teatro deste lugar não tem chão. As personagens acotovelam-se nos bastidores, o(s) espetador(es) emociona(m)-se e sobrevoam um reino de histórias tensas e intensas. A realidade é condicionada pela angústia dos dias, busca de um lugar anterior algures na infância.
A dança parada das meninas que pervertem o beijo (oculto), e a menina artista que se purifica por entremeio da arte. Os desenhos florescem, as pinturas germinam, há uma janela, esboços de teatro quase grotesco, são presenças veladas de Frida, Espanca ou Medeia. A arte da Carla Cabral é tão somente a(s) mulher(es), acesa(s) de sangue. Mulheres remoendo o linho bordado a pincel, grafite, textura de cor ancestral ou arame formal. A não princesa escreve um nome… uma história forte mas num tom baixinho, vagaroso. A mulher cão ou não princesa, desenha sobre a nossa retina os dados de uma corrosão da vida, a existência crua, cruel, cronometrada. Agora são as luzes «acendidas» no lugar do palco, emite-se em voz off o poema de Eduardo Pitta, (in Desobediências, 2011): Queria que ficasses/ naquele olhar/ a caminho da curva/ do  meu ombro.                                                                                           Paulo Sérgio BEJu, nov2011


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